Congresso Brasileiro Promulga Leis Fundamentais para a Transição Energética do Brasil
Em 30 de setembro de 2024 e 9 de outubro de 2024, respectivamente, foram publicadas duas importantes leis:
- Lei nº 14.990/2024, que estabelece o Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC), como parte das iniciativas do Brasil para a transição energética e a descarbonização econômica, com o objetivo de posicionar o país como líder global na produção de hidrogênio renovável; e
- Lei nº 14.993/2024, referida como “Lei do Combustível do Futuro”. Ela estabelece programas nacionais para incentivar o uso de combustíveis renováveis, regulamenta a captura e o armazenamento de CO₂, promove a descarbonização e altera as proporções de mistura de etanol e biodiesel na gasolina e no diesel.
Este informativo aborda os principais pontos de cada uma das leis.
I. Lei do PHBC
A Lei nº 14.990/2024 chamou atenção principalmente por destinar R$ 18 bilhões até 2032 para o desenvolvimento da indústria de hidrogênio de baixo carbono. No entanto, seu escopo é mais amplo, estabelecendo o PHBC, que define metas claras e oferece incentivos fiscais para acelerar a transição energética, fortalecer o mercado interno de hidrogênio renovável e promover seu uso em indústrias de difícil descarbonização, como a siderúrgica e a petroquímica.
Principais aspectos da lei:
1. Criação do PHBC
O programa visa desenvolver e comercializar hidrogênio de baixo carbono e hidrogênio renovável, impulsionando a transição energética do Brasil e reduzindo as emissões de gases de efeito estufa (GEE).
2. Metas e Objetivos
Os principais objetivos incluem:
- promover o uso de hidrogênio de baixo carbono em setores industriais de difícil descarbonização, como siderurgia, fertilizantes e petroquímica;
- desenvolver o mercado interno de hidrogênio sustentável;
- incentivar o uso de hidrogênio de baixo carbono no transporte pesado.
3. Incentivos Fiscais
O PHBC oferece créditos fiscais de até 100% da diferença de preço entre hidrogênio de baixo carbono e combustíveis substitutos, com prioridade para projetos com as menores emissões de GEE e maior impacto tecnológico e industrial.
- Elegibilidade: os projetos devem contribuir para o desenvolvimento regional, mitigação climática, avanço tecnológico ou diversificação industrial.
- Uso: os créditos podem ser usados para compensar débitos tributários ou ressarcidos em dinheiro dentro de 12 meses.
- Limites: o total de créditos aumentará progressivamente de R$ 1,7 bilhão em 2028 para R$ 5 bilhões em 2032.
- Penalidades: projetos que não cumprirem os requisitos poderão ser multados em até 20% do valor do crédito.
4. Limites de Crédito Fiscal (2028–2032)
Um total de R$ 18,3 bilhões será concedido entre 2028 e 2032:
- 2028: R$ 1,7 bilhão
- 2029: R$ 2,9 bilhões
- 2030: R$ 4,2 bilhões
- 2031: R$ 4,5 bilhões
- 2032: R$ 5 bilhões
5. Procedimentos de Concessão
Os créditos serão concedidos por meio de processos concorrenciais, priorizando projetos que ofereçam as menores emissões de GEE e o maior potencial para o desenvolvimento da cadeia de valor nacional. Apenas beneficiários do Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (REHIDRO) ou compradores de hidrogênio poderão concorrer.
6. Uso dos Créditos Fiscais
Empresas ou consórcios beneficiados poderão utilizar os créditos de duas maneiras:
- Compensação de Débitos Tributários: para abater débitos federais, como a CSLL.
- Ressarcimento em Dinheiro: caso não haja débitos a compensar, as empresas poderão solicitar o ressarcimento em até 12 meses.
7. Monitoramento e Relatórios
O governo publicará relatórios anuais avaliando os resultados do PHBC, incluindo impactos econômicos e ambientais, além de listar projetos habilitados e sanções aplicadas.
Ao definir incentivos fiscais claros e metas para a descarbonização de setores de difícil transição, o programa visa apoiar a transição energética do Brasil e reforçar sua posição no mercado global de hidrogênio renovável.
II. Lei do Combustível do Futuro
1. Mobilidade Sustentável de Baixo Carbono
A Lei nº 14.993/2024 integra iniciativas como a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) e o Programa de Mobilidade Verde e Inovação (Programa Mover), visando promover a mobilidade sustentável. A análise do ciclo de vida será utilizada para mitigar as emissões de CO₂, considerando dois ciclos:
- Ciclo do Poço à Roda (até 31/12/2031): inclui o consumo energético dos veículos.
- Ciclo do Berço ao Túmulo (a partir de 01/01/2032): Abrange as emissões desde a extração de recursos até o descarte dos veículos.
O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) definirá os valores de Intensidade de Carbono (ICE), e o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços estabelecerá metas de consumo e emissões.
2. Programas Nacionais
A lei institui três programas principais:
- Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV): incentiva a pesquisa e o uso de combustíveis sustentáveis na aviação. A ANP calculará as emissões de GEE do SAF e estabelecerá percentuais mínimos de redução de emissões, progressivamente até 2037.
- Programa Nacional de Diesel Verde (PNDV): promove o uso do diesel verde, com uma participação volumétrica mínima obrigatória de 3% no diesel comercializado. A ANP determinará os percentuais obrigatórios de adição.
- Programa Nacional de Descarbonização do Produtor e Importador de Gás Natural e de Incentivo ao Biometano: estimula o uso de biometano e biogás, com o CNPE estabelecendo metas anuais de redução de emissões, começando em 1% em 2026 e podendo chegar a 10%.
Além disso, a lei prevê o aumento gradual dos percentuais obrigatórios de mistura de etanol e biodiesel na gasolina e no diesel. Algumas das principais alterações incluem:
- Etanol na Gasolina: a mistura aumentará de 27% para 30%, podendo atingir 35%, dependendo da viabilidade técnica.
- Biodiesel no Diesel: a adição aumentará em 1 ponto percentual por ano, começando em 15% em 2025 e atingindo 20% em 2030.
- Combustível Sustentável de Aviação (SAF): as companhias aéreas deverão reduzir as emissões em 1% ao ano a partir de 2027, alcançando uma redução de 10% até 2037.
- Diesel Verde: incentiva a produção de diesel verde, com mistura mínima obrigatória de 3% no diesel a partir de 2027.
- Combustíveis Sintéticos: propõe um marco regulatório para combustíveis sintéticos (e-Fuels), que utilizam hidrogênio e CO₂ como matérias-primas.
3. Captura e Estocagem de CO₂
A lei regulamenta a captura e estocagem geológica de CO₂, com a ANP responsável pela autorização e fiscalização dessas atividades. As autorizações terão validade de 30 anos, com possibilidade de prorrogação, e os operadores deverão seguir condições específicas.
A Lei nº 14.993/2024 também altera regulamentações anteriores, como a Lei do Petróleo (Lei nº 9.487/1997) e a Lei do Abastecimento Nacional de Combustíveis (Lei nº 9.847/1999):
- As definições de "biocombustível," "etanol" e "bioquerosene de aviação" foram atualizadas, sendo o bioquerosene de aviação agora chamado de "combustível sustentável de aviação." Novas definições para "biogás," "biometano," e "combustível sintético" foram incluídas.
- O CNPE pode agora estabelecer diretrizes para a regulação da captura e estocagem de CO₂, além de metas para biogás e biometano.
- A ANP será o órgão regulador da indústria de combustíveis sintéticos e da captura e estocagem de CO₂.
- A Petrobras está autorizada a expandir suas atividades para incluir a captura e estocagem de CO₂, além de iniciativas de transição energética.
4. Vetos Presidenciais
O presidente vetou três trechos do texto aprovado pela Câmara dos Deputados, relacionados a critérios contábeis que poderiam afetar a arrecadação. Artigos referentes à compra de biometano por comercializadores e importadores de gás natural, bem como à regulamentação da captura e estocagem geológica de CO₂, também foram vetados. Um dos artigos vetados tratava da tributação do Certificado de Garantia de Origem de Biometano (CGOB). Esses vetos agora serão analisados pelo Congresso Nacional, que poderá mantê-los ou derrubá-los.
O informe foi produzido pelos sócios Thiago Luiz Silva, Paula Padilha Cabral Falbo e Camila Borba Lefèvre, juntamente com a associada Fernanda Aquino, todos da área de Energia & Recursos Naturais: Transição Energética, que estão à par do tema e à disposição para esclarecer dúvidas e avaliar cenários.